segunda-feira, 22 de setembro de 2008

a jabuticaba e a guerreira

A morte a visitava de vez em quando. Eram os dias dos sonhos conturbados e das respirações curtas. Sentia como se no meio do seu peito estourasse fogos de artifício com defeito. Era uma pipoqueira de jabuticabas.
Ela, nessas ocasiões, deitava, esticava os braços ao chão acreditando que abraçando o mundo ela se sentiria um pouco menos só. Em vão. Então, sentava e apertava as mãos fechadas. Gritava e dava socos. Para os cegos - ninguém via. Ela criava histórias e assassinatos e conversava com pessoas que não respondiam, e não via. Era uma maneira de despistar a morte.
Quando ela era criança ela aprendeu que a morte era uma mulher de preto e foice na mão. Com o tempo, ela percebeu que ela era a própria foice e que a morte era simplesmente a vontade de usá-la ou não. Ela era a morte. E quando se percebera, já deixava de ser no instante seguinte.
Pois, ser morte era tomar consciência da própria vida. E ela fazia isso consigo mesma com certa frequência. Ela precisava de meios de saber que aquela era uma vida real e não um reflexo de algo imaterial e metafísico. Ela queria a certeza de que estava viva.
Ela queria ser uma jabuticaba. Suculenta, grande, molhada - pronta para ser estourada. Um segundo antes. Em plenitude. Ela queria ser toda jabuticabeira. Ela irrigava ela mesma. Às vezes com lágrimas, às vezes com medos, às vezes com surtos. Ela precisa mudar o estado natural das coisas. Molhar, brotar, líquido-sólido: escorrer suas verdades para depois encontrá-las.
E foi-se. E fez-se.
Com o tempo, troncos duros e cascas secas se formaram. E as jabuticabas começaram a brotar de menos para menos. E quando nasciam, estouravam com certa velocidade. Era a morte em seus canteiros. Constante. Sem tempo da florada próxima. Eram os estouros para os caminhos arriscados. Era a certeza da luta. Era viver sobre a certeza da morte. Sem nada a perder. Era já uma guerreira. Com uma foice na mão e uma vontade de vir a ser. Fogos de artifício.

Um comentário:

Anônimo disse...
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