segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

O interfone

E o homem tocou a campainha e disse que queria dinheiro para passagem. Passagem para onde meu filho?, a mulher respondeu, pensando que ela mesma queria partir para algum lugar onde não existisse angústica no peito e onde pudesse carregar sempre um sorriso na cara. Para minha casa, senhora, é que moro longe. Moro longe, moro longe, moro longe....as palavras ecoaram dentro da pele e subiram pelo peito até a cabeça. Eu também moro longe, pensou, bem longe de onde estou. Desligou o interfone e nada mais disse.
O homem, faminto e sem dentes, insistiu na campainha. Ô dona, vê com a sua patroa se ela pode me pagar a passagem. Era ela a patroa de si mesma e sobre isso ela não tinha dúvidas, então, de certo modo, ficou um pouco satisfeita. Espera que vou ver!, respondeu segundos depois. Andou pela casa vazia, sentou na poltrona de leitura com um copo d`água e deixou os minutos passarem. O homem, aflito já, esperava lá fora no frio. Ela bebeu outro copo d`água, e mais outro, e mais outro. E, quando já estava satisfeita de líquidos e com a cabeça mais fria, foi ao interfone e disse: Moço, aqui não temos passagens para nenhum lugar. Estamos todos mortos. E desligou da tomada.

Nenhum comentário: