domingo, 16 de julho de 2017

A fuga

Foi numa manhã de domingo que me dei conta de que você havia fugido de casa. Abri a janela, chamei pelo nome e a única coisa que ouvi foi o latido do cão do vizinho. O pânico me dominou da cabeça aos pés e sai perambulando pela rua com o grito de dor engasgado no peito. Corri ruas, deixei cartazes, conversei com os vizinhos e orei, como nunca tinha feito antes. Nunca imaginei que pensar a vida sem o seu olhar pudesse me fazer entender o tamanho do amor que sinto por você. E foi nesta escapada que tudo se deu. Nessas horas de abandono.
Ali, sozinha, me deparei com o sentimento mais profundo do que é ser deixada. Não por isso ou aquilo, justificativas mentais que nós seres humanos criamos para inventar a vida, mas simplesmente porque era a sua hora de viver uma despedida, de ir embora. Instintivamente, partida. E me vi, dividida, rachada ao meio, entre me abandonar na dor e tentar encontrar meu eixo, aquele que talvez pudesse me sustentar sem você. A gente já está conectado há tempos, mas eu sempre duvidei disso. Duvidei que você pudesse adivinhar meus pensamentos, meus choros e mau humores. Duvidei da sua bruxaria felina. E pra quê? Naquele momento, era só isso que restava acreditar.
Tomei um chá, comi uma banana e decidi que era preciso seguir, mesmo quando tudo parece parado. Vou cozinhar, pensei. Talvez um dia ele volte. Quando ele achar que for a hora. Quando ele quiser me reencontrar.
Abri a geladeira, peguei quiabos. Uma faca na gaveta de talheres e qual não foi a minha surpresa quando abri o gavetão de panelas: você, com esse seu olhar azul, encolhido, mas sereno. Me mirou e me disse, assim, como se já tivesse ido e voltado para algum lugar distante: miau!

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